Preâmbulo de um padecer
Fez silêncio! Num desbotar do pensamento, esvaí ante a seta que me lançava amargurados rumores. Era mais um dia comum, os pássaros cantavam, o vento soprava ameno e o crepúsculo nunca se mostrara tão belo, até então, como um aviso de que tamanha calmaria vestia disfarce, guardava surpresas embaladas de dissabores que corroem os sentidos dos mortais. Não pude esquivar-me. Caminhar ensandecido, há tempos se tornou a casa que acolhia as destrezas da minha boemia. De amante galanteador a um sonhador desiludido, vítima do sentimento mais solene que em meu ser delongou, mas que deixara indícios de sua indiferença. De certo este dia adoeceu meus sentidos, no momento em que soube da ingratidão. Sequer veio despedir-se! E aquele amor nunca me pertenceu. Quando dei por conta, meu eu divagava entre lembranças que lançavam furor e pranteei o pesar de minha fragilidade sôfrega. Pensamentos dispararam na busca incessante pelo cheiro que adentrava em meus poros enlaçando nossos beijos cálidos, o abraço firme e a sua forma esplêndida de se entregar, em cada movimento abrasado do seu corpo emanam as poesias mais belas, aprisionadas em paredes, e que a minha mente consegue captar. Seus olhos afáveis resplandecem paixão... Memórias, tudo que me sobrou! Insensatos atos que o coração insiste em acolher. Embora prisioneiro seja eu de um sentimento insano, que vai além do que jamais senti em minhas andanças ao luar boêmio, aceito a penitência. Por quantas vezes me for permitido apreciar as agruras desse círculo de impossibilidades que fulguram meus desejos, que doses de desvarios me sejam servidas em medida certa. Sei que meu chão não pode afundar mais que isto.
"Quando a esperança e a promessa desaparecem
E o sol se esquece de nascer
Eu estou sozinho e com sede
Mas é melhor eu me manter seco
Não mais que dois goles de lágrimas..."