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Orgulho Asteca


"(...) Embora as paredes da sala do trono estivessem repletas de tapeçarias de penas e painéis de pintura, não havia outros móveis além do trono, aquelas cadeiras baixas para as visitas e, bem em frente ao ueytlatoani, uma mesa baixa de ônix negro sobre a qual repousava, voltado para ele, um branco e reluzente crânio humano.
- Meu pai, Coiote Abstinente, o pôs aí - disse Nezahualpili, ao perceber que eu olhava para o objeto. - Não sei a razão. Pode ter pertencido a algum inimigo derrotado, para o qual gostava de olhar com maldosa satisfação. Ou algum ente querido perdido pelo qual nunca deixou de chorar. Ou conservou-a pela mesma razão que eu.
- E que razão é essa, senhor porta-voz? - Perguntei.
- Entram nesta sala enviados trazendo ameaças de guerra ou propondo tratados de paz. Chegam cheios de queixas, reclamações, ou pedindo favores. Quando essa gente dirige-se a mim, seus rostos podem contorcer-se de raiva, abater-se de sofrimento ou sorrir, em falsa devoção. Deste modo, enquanto os ouço, não olho para os seus rostos, mas para esta caveira.
Só consegui dizer:
- Por que, meu senhor?
- Porque este é o rosto mais limpo e mais honesto do homem. Nenhuma pintura ou disfarce, nenhuma astúcia ou careta, nenhum piscar furtivo ou sorriso para angariar minha simpatia. Apenas um riso irônico e imutável, zombando das preocupações e urgências dos vivos. Quando uma visita pede que eu promulgue uma lei imediatamente, contemporizo, dissimulo, fumo um poquietl ou dois, enquanto olho longamente para esta caveira. Ela me lembra que as palavras que pronuncio podem sobreviver à minha própria carne, podem se manter durante muito tempo como firmes decretos. E que efeito farão nos que então viverem? Ayyo, frequentemente esta caveira tem me prevenido contra decisões impacientes e impulsivas. - Nezahualpili voltou os olhos da caveira para mim e sorriu. (...)"

(Trecho do livro "Orgulho Asteca" pp. 220 - 221.)


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